26 de abr. de 2020

Diário do entre-mundos 30

Se você estava cansado da obsolescência programada de suas impressoras, celulares, computadores, etc, chegamos na fase da obsolescência não-programada.
Até o final do ano me mudo para Botafogo. Bairro com cinemas, livrarias, muitos bares, enfim, tudo que perdeu o sentido de ser. Botafogo se tornou vintage, uma espécie de Ouro Preto da era pré-Covid.
No supermercado, ocupado em quase sua totalidade por jovens entregadores que nunca pensaram em comprar salmão defumado, é toda uma forma de funcionamento que se torna obsoleta. A arquitetura dos supermercados é feita de maneira que, antes de achar o que você procura, você possa cruzar com 10 supérfluos. Pois, esse supermercado está obsoleto. O negócio é facilitar a vida dos entregadores e que eles possam achar o que precisam e deixar o supermercado o mais rápido possível para novos mascarados entrarem.
As empresas se adaptarão rápido às novas camadas de opressão.
No mundo em que as lives substituíram os shows, que a sala de aula parece uma antiga memória dos restos do mundo disciplinar, talvez sejamos nós mesmos que tenhamos nos tornado obsoletos.
Que isso aconteceria, era uma certeza, mas veio rápido. Talvez as angústias e ansiedades que atravessam esses tempos sejam também por percebermos que as arquiteturas e organizações subjetivas que construímos até aqui subitamente se tornaram obsoletas.
Não é um mundo sem saída, mas o esforço para não sermos apenas um resto a ser cuidado pelo patrimônio histórico e cultural não será pequeno.

--Diário do entre-mundos 30 --

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