15 de jan. de 2011

artigos da semana (fechando as abas do Firefox)



Uma semana repleta de artigos excelentes sobre questões urgentes:

1 - Batisti: (Pt.)
PELUSO PODE SER IMPEDIDO POR MANIPULAR CASO BATTISTI (link)

2 - Comunicação, Cultura digital, democracia: (Pt.)
Entrevista com a Ivana Bentes:

3 - Democracia – (FR)
Capítulo do novo livro do maurízio Lazzarato : Une lecture parallèle de la démocratie: Foucault et Rancière


4 - Imagem (pt.)
Palestra com Didi-Huberman e Rancière

5 - Globalização, Território e identidade (FR)
La mondialisation fait-elle un monde habitable ?, Bruno Latour

6 - As mortes na região Serrana (RJ) e a mídia (PT)

4 de jan. de 2011

A cultura está no centro das disputas do capitalismo contemporâneo

Minha tia me ligou me dizendo que estou de má vontade com a nova ministra da cultura, a Ana de Hollanda. Não é verdade.
Estou atento, disse para ela.
Eu efetivamente ouvi o que ministra disse em seu discurso de posse e nesse discurso ela se colocou muito distante da dimensão necessariamente política e inclusiva que tem a cultura no momento. Fazer da cultura um agente da democracia é o legado do governo Lula.

Alguns pontos podem ser destacas no discurso da Ministra.

A centralidade da arte e não da cultura.
O risco de colocar a arte em primeiro plano está em se enfatizar o produto do artista, transformando o ministério da cultura em um produtor de espetáculos ou em um distribuidor de “cultura”. Uma grande Funarte, como disse o Belisards no twitter.
Ao centrar o ministério na arte há o risco de nos distanciarmos da noção de cultura que o Gil forjara já em seu discurso de posse, em 2003:
“Cultura como tudo aquilo que, no uso de qualquer
coisa, se manifesta para além do mero valor de uso.
Cultura como aquilo que, em cada objeto que
produzimos, transcende o meramente técnico. Cultura
como usina de símbolos de um povo. Cultura como
conjunto de signos de cada comunidade e de toda a
nação. Cultura como o sentido de nossos atos, a soma
de nossos gestos, o senso de nossos jeitos.”

Para mim cultura é isso. Um ministério tem o dever de possibilitar a plenitude da produção e da invenção cultural de um povo. Isso passa pela democratização das possibilidades sensíveis.
O trabalhador que passa 4 horas no ônibus não passa a ter acesso à "cultura" porque agora tem um vale-cultura. O que não quer dizer que o vale-cultura não seja importante.
A cultura deveria assim ser um ministério transversal a todo o governo, estar na mesa em todas as negociações centrais. Como pensar o desenvolvimento, a ciência e a tecnologia, a educação e a economia se o direito à plenitude do que pode, estética e sensivelmente, uma comunidade não é parte do problema.
É por isso que quando a nossa ministra finaliza o discurso dizendo que não há arte sem artista, eu fico preocupado. De maneira abrupta diria: sim, há arte sem artista, mas, mais importante que isso, há cultura para além da arte.
A centralidade do artista e do autor em detrimento dos processos
Da mesma forma que acredito que a cultura deveria ser transversal ao governo – assim como o meio-ambiente –, acredito que uma parte importante dos embates contemporâneos no interior do capitalismo se dá na luta pelo direito a plenitude dos possíveis do mundo contemporâneo. Acesso à informação, tempo para a reflexão e para a fruição, possibilidade de usufruir do mundo e de tudo que nada custa.
Como disse o Giusepe Cocco em um twitter: A cultura não é um setor e os "artistas" não são uma "classe" (no máximo uma corporação). A cultura é o cerne do valor hoje: relação!
Essa percepção de cultura retira do artista a centralidade nos processos culturais. Uma centralidade que pode ser extremamente conservadora se formos privilegiar o artista e não a democracia em questões como os direitos autorais, os acessos às mídias digitais, internet e softwares, etc. Ao privilegiar o artista retiramos do processo cultural o criador, o povo. Como disse ainda o Gil em seu discurso de posse, o problema do estado é ficar a altura da criação do povo.
Foi com essa percepção do estado que vimos nos últimos anos o Brasil assumir um importante papel no debate sobre o acesso à cultura tanto no consumo como na produção ligada à internet, necessariamente democrática, aberta e neutra, como expressado na carta à ministra escrita por diversos representantes da sociedade civil (http://culturadigital.br/cartaaberta/) Foi ainda com essa percepção do que é cultura que os Pontos de Cultura se tornaram uma das mais bem sucedidas iniciativas do governo Lula.
Por conta dessas questões, a cultura está no olho do furacão, no centro dos debates que influenciarão a vida de todos e no centro do que há de mais valorizado no capitalismo contemporâneo: a criação e a invenção das vidas mesmos. Não é por acaso que empresas como Google e Facebook se tornaram as mais valiosas no mundo atual.
Se o ministério da cultura for despolitizado, se tornando apenas um fomentador da arte e do consumo de arte estaremos abrindo mão de debater e influenciar o capitalismo lá onde ele é mais efetivo e poderoso, na cultura.