11 de jul. de 2012
10 de jul. de 2012
Professores
Meu objetivo não é fazer um CV, mas fazer uma pesquisa.
A atual corrida por CVs leva alguns a fazer copy/paste de si
mesmos.
Devemos esquecer que a pesquisa é uma narrativa e agora
devemos escrever em inglês?
As pesquisas são fundadas em chamadas de projetos com muito
dinheiro para as ciências duras. Isso nos obriga a pesquisar ao mesmo tempo em que
pensamos nos próximos projetos.
Os laboratórios de pesquisa participam hoje de uma corrida
por projetos entre instituições, com muitos pesquisadores...
O que falta aos
professores e pesquisadores na universidade é tempo.
(Declarações retiradas do Cahier du Cinéma de março de 2012
dedicado às escolas de cinema – na França)
7 de jul. de 2012
Breves notas sobre a noção de diferença: uma conversa entre amigos.
Caro amigo, poderia te indicar alguns livros sobre a noção de
diferença tendo o Deleuze como personagem central, isso pode ser feito ainda se
o que te interessa não estiver nessa carta. Devo te lembrar que não sou
filósofo, o que me permite uma reflexão selvagem em torno na noção. Devo te
dizer também que essa noção é fundamental para o Bergson, mas não é com ele que
sigo, apesar das ressonâncias.
Como nosso problema é a arte e os sujeitos que com a arte –
ou na falta dela – estão na vida, isso implica, primeiramente, em pensarmos
esses sujeitos em relação com forças, poderes e criações que os transformam e
que são transformadas por eles. Comecemos dizendo que o sujeito é sempre parte
de um todo em transformação e que é, ele mesmo, variação. Assim, não se trata
de pensar, primeiro, em sujeitos que são diferentes uns dos outros, mas de sujeitos que diferem em si mesmo.
Complicado? É. É complicado porque estamos sempre tentando codificar os
sujeitos a partir de seus modos de vida: classes, identidades, ideologias, etc.
Mas, pensar com a diferença significa que, além da diversidade de modos de
vida, cada modo de vida não para de se diferenciar de si mesma e que para cada
código, para cada identidade há um resto. Esse resto pertence a sujeitos e
comunidades, não é ainda do indivíduo, não se atualizou como uma forma, um modo
de ser. Esse resto está ali, existe, mas, quando pensamos em termos de códigos
e identidades tenderemos a descartar justamente o resto que desestabiliza esses
lugares definidos, esses modos de vida que reconhecemos: favela, fanqueiro,
intelectual, gay.
“diferenciar-se é o movimento de uma virtualidade que se
atualiza” (Deleuze sobre Bergson – Ilha deserta p. 57)
O Simondon, filósofo importante para o Deleuze, tem uma ideia
que é linda. Ele diz assim, o sujeito é uma fase do ser. E o ser não para de se
defasar, ou seja, ele não cessa de deixar de ser o sujeito que ele é. Ou seja,
é a própria vida que é um processo de diferenciação, de defasagem em relação
si. O movimento, a variação, a diferença, não é assim uma diferença de algo em
relação a algo, ou o movimento de alguma coisa, a diferença é uma coisa em si,
inseparável do que constitui a vida. Essa percepção traz fortes implicações
para pensar o papel da arte e do que o sujeito é hoje.
Primeiro, se o sujeito não para de se diferenciar, o que está
em jogo são as forças com as quais ele se associa, os afetos que o estimulam e
potencializam e não a história desse sujeito em um processo de causa e efeito
que justificaria o que ele é hoje. A diferença torna-se um problema relacional,
dos modos de operar a memória, o que volta no presente, e as materialidades que
liberam e constrangem o as possibilidades de novas associações, afetos,
invenções. Nesse sentido, importa o que o sujeito pode hoje e não o que ele é.
Importam as conexões e não as teleologias. O sujeito configura-se como
atualizações de um agenciamento, de um emaranhado heterogêneo de afetos,
estéticas, poderes, etc. E o que aparece
a partir desse emaranhado, que sujeitos são possíveis, nós não sabemos, esse
agenciamento é um não-sei-o-que de possibilidades, uma virtualidade. Em outras
palavras, diferenciar-se passa por um processo inventivo não funcionalizável –
algo bem diferente da necessidade de criação para a solução desse ou daquele
problema.
Mas, como disse, o sujeito não varia sozinho, ele traz junto
todos as linhas com as quais ele se conecta para a sua própria variação. Não sei
se percebes, mas o que está em jogo não é um sistema em que um contexto define
um sujeito ou uma história define uma comunidade, mas a multiplicidades de
afetos e acoplamentos, de componentes heterogêneos, que permitem que sujeitos e
comunidades ampliem as possibilidades de experiências sensíveis, de “experimentar-se”.
A política, nesse caso, se faz por uma inflação das possibilidades de
experiências e não pela escolha do estado, ou qualquer outro poder, desta ou
daquela experiência. Os chamados processos subjetivos não se dão no sujeito,
não se trata de conhecer e transformar o sujeito a partir de uma realidade.
Diferenciar-se é inseparável de transformar a realidade.
Começamos essa conversa fazendo uma crítica à noção de
diversidade, se bem me lembro. A crítica mais selvagem à noção de diversidade
poderia ser feita dizendo-se que em um mundo diverso, todos já são alguma coisa
e já têm o seu lugar ou devem lutar por ele. O problema disso é que esse mundo
seria um conjunto fechado, delimitável e, em grande parte, a noção de diferença
vem para trazer a possibilidade da invenção fazer parte desse mundo diverso. Se
a invenção faz parte, são os próprios lugares dos sujeitos que se instabilizam.
Não há dúvida que existe um desafio político. Como lutar pelos direitos de
minorias sem que essa luta se torne um empecilho pra o “diferir-se” desses
sujeitos? Talvez se partirmos do fato de as identidades serem uma narrativa
excessiva que impede que certas ações, a diferença, faça parte dos
processos subjetivos.
Por exemplo, um negro em uma sociedade que o discrimina. Isso
faz com que ele seja impedido de viver plenamente seus processos subjetivos uma
vez que a cada relação afetiva, de trabalho em suas redes sociais e
institucionais, a sua presença é mediada por uma narrativa – ser negro – que
trava a própria possibilidade de diferenciar-se nessa rede, nesse processo. Ele
precisa assim se afirmar como negro para ter o direito de não sê-lo. Parece
paradoxal, mas não é. Trata-se justamente do reconhecimento de que existem
forças que o impedem de se defasar em relação a ele e à comunidade. Trata-se de
afirma-se para ter o direito a entrar em uma dinâmica de variação em que ele
seja mais e menos que essa narrativa central, que ele não seja um produto do
meio que lhe dá uma identidade mas que possa entrar em um processo de
subjetivação que é individual e coletiva simultaneamente. Sua identidade se
torna assim necessária para que um “ser negro” se torne um possível de todos;
uma linha de diferenciação que atravesse brancos, negros e amarelos. A
identidade necessária para a diversidade não pode assim tornar-se um recorte
pertencente à tal ou tal sujeito, a esse ou aquele grupo de determinada cor,
opção sexual ou religiosa, mas uma potência que seja parte da comunidade e que
com ela os processos subjetivos, as formas de os sujeitos diferenciarem-se, se
torne mais rico em experiências, complexo e múltiplo.
A identidade não é uma transcendência, é preciso que ela faça
parte da vida, da diferença. Ou seja, quando o “ser negro” volta ao debate,
volta como necessidade politica – e ele volta sempre -, não é o mesmo que
volta, não é o igual, não é a representação de um ideal definido pela história,
pelo movimento, pela polícia ou pela nova linha de cosméticos, mas de um ser
negro que é em si uma transformação, diferença de si e do que esperamos que
seja.
Politicamente, trata-se de tornar-se incapturável. Todos os
poderes sabem exatamente como lidar com o que conhecem, o problema é
administrar o que não é nunca o mesmo, as forças ativas, de invenção.
Nesse texto do Deleuze sobre o Bergson, ele diz: a diferenciação é a produção de objetos.
Se pensarmos em termos de uma política, estamos distantes então de uma política da representação, mas próximos de uma política da invenção em que, como escreveu Plotino "a resitência de um ato resiste no ato" ou "A experiência é ela mesmo a autoridade" (Blanchot).
Nesse texto do Deleuze sobre o Bergson, ele diz: a diferenciação é a produção de objetos.
Se pensarmos em termos de uma política, estamos distantes então de uma política da representação, mas próximos de uma política da invenção em que, como escreveu Plotino "a resitência de um ato resiste no ato" ou "A experiência é ela mesmo a autoridade" (Blanchot).
Um política da diferença ganha proximidade com a arte, sem
que uma se confunda com a outra, uma vez que a imaginação e a criação são
decisivas nos processos de diferenciação. A arte, nesse caso, é um
intensificador do que faz o emaranhado, o agenciamento, variar, logo, faz variar
tudo que se atualiza, sujeitos e comunidades. A arte permite uma intensificação
da própria diferenciação, das formas de variação do agenciamento, das formas de experiência. A arte é um
acelerador de linhas de subjetivação, intensificador dos possíveis de sujeitos
e comunidades. Uma política da diversidade dá poderes aos sujeitos e
comunidades que já sabemos o que é - estamos no campo da representação -, uma política da diferença é bem mais
arriscada: como facilitar os possíveis se não sabemos que sujeitos e
comunidades se atualizarão?
O papo segue,
Meu abraço
Cezar
1 de jul. de 2012
Capitalismo e açucar - Deleuze aula de 1980 / MIl Platôs
Gilles Deleuze, Março de 1980
Pensando o estado e o capitalismo
“É fascinante a situação do Brasil.
Uma situação de suspense. Estamos diante da possibilidade de um estado social democrata e eleições livres ou a possibilidade da volta de um estado totalitário.
Até onde irá o entendimento entre esses polos?
Caso raro na história em que esse suspense se apresenta.”
http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k1282807.r=deleuze.langFR
Pensando o estado e o capitalismo
“É fascinante a situação do Brasil.
Uma situação de suspense. Estamos diante da possibilidade de um estado social democrata e eleições livres ou a possibilidade da volta de um estado totalitário.
Até onde irá o entendimento entre esses polos?
Caso raro na história em que esse suspense se apresenta.”
http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k1282807.r=deleuze.langFR
A aula tem dois
focos: Uma reflexão sobre a diferença entre o estado social democrata e o
totalitarismo feita a partir da forma como o estado cria ou esvazia os axiomas. Retomado Virilio, Deleuze diz que o estado totalitário é, na verdade, o estado mínimo - fundado apenas em dois
axiomas, da acumulação de reservas e da inflação. O resto são teoremas -
desdobramentos desses axiomas.
O estado SD
tende a multiplicar os axiomas: um axioma para as mulheres, um para os negros,
etc.
O segundo foco
da aula é sobre o marxismo. Muito bom!
Qual o limite do
capital para Marx?
Trata-se de um
limite interno e não externo - ecológico, humano ou energético. Um limite
imanente. Quanto mais ele se aproxima, mais ele o empurra.
Esse limite
traduz uma contradição.
O capitalismo
inventa a produção pela produção. Ao mesmo tempo que inventa um produzir por
produzir; um produzir para o capital, uma contradição aparente.
Para explicar
esse limite interno do capital, Deleuze volta ao Brasil com o Livro “O Açucar e
a fome” de Robert Linhart. No livro o autor pesquisa o desenvolvimento do
capital ligado ao açúcar e como este capital está envolvido em uma rede de
poderes que ao mesmo tempo em que é pautado pelo axioma exportador é produtor
de capital, de açúcar e de fome. Fome produzida pela evolução do capital com a
monocultura, com homogeneidade da plantação, pelo latifúndio. Nossa conhecida
indústria da seca que Deleuze apresenta como um produto do próprio desenvolvimento,
um limite imanente ao próprio capital.
O limite que não
paramos de empurrar. Não é que as pessoas morrem de fome, esse seria o limite
definitivo, mas não, o que acontece é uma produção incessante e crescente de
famintos, diz Deleuze, ou, pobres, se quisermos.
Esse exemplo permite
Deleuze explicar como não há volta atrás no caso do capitalismo e essa é a
nossa desgraça.
Quando há
excesso de açúcar, começamos a usar em carros – álcool. Até um certo ponto
podemos usar os mesmo motores, mas, quando é necessário colocar mais álcool nos
carros, as indústrias precisam fazer novos motores, operando um movimento
essencial na transformação do capital constante, ou seja, é preciso
desvalorizar um capital constante para produzir outro.
No momento que a
indústria começa a fazer carros com motores para álcool, não há mais volta na
monocultura e na forma de vida que esta implica. Eis a flecha irreversível do capitalismo.
Tão parecido com os argumentos pró-Belo Monte!
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