Em recente debate com engajados
servidores do MinC estive diante do óbvio. Não esperemos nada do MinC, da
Ancine, do poder público.
Se o cinema pós-industrial existe, e
é o que mais nos interessa hoje, não é por conta do estado. Mas, como sabemos, a democracia se declara! Isso, significa
que devemos pressionar, educar, exigir, impor.
O estado é nosso, mas esses poderes
não cessarão de dizer que somos a periferia, que a cultura sem espetáculo não é
cultura, que é preciso movimentar a indústria, que as vidas são vazias e que se
não houver sustentabilidade não serve. Eles dizem isso mesmo!
A vida virou um problema de gestão,
o que significa que a falência é algo possível.
Quando o MinC diz que quer levar
cultura para os pobres ele nega a democracia duas vezes. Primeiro diz que o
pobre não tem cultura, retirando dele o que ele é. Segundo, o MinC se dá o
direito de dizer o que é cultura e o que não é. Formas eficazes de eliminar o
outro.
O MinC pode mudar, mas qual estado
está disposto ao descontrole da cultura? Qual poder está disposto ao poder de
qualquer um?
O que nos interessa no cinema hoje
existe sem pagar pedágio para ninguém, existe pela força de jovens hiperativos
que não se dispõe ao aburguesamento clássico que o capitalismo industrial
prometia.
Avise aos jovens, essa multidão
entre a PUC e as favelas, entre Tahir e Puerta del Sol, que eles terão que
trabalhar longe das redes sociais, com horários que separam vida e trabalho.
Rirão em nossa cara ou farão o país parar.
Uma juventude que se constitui
trabalhando e se inventando em redes sociais e coletivos de criação não está
disponível a largar esse mundo de hiperatividade produtiva para ser força de
trabalho analógica em um mundo nostálgico da ordem e da disciplina das fábricas
– tanto à direita quanto à esquerda.
Quando a produção não se desdobra em
ganhos sociais, há algo errado. É isso que leva milhões às ruas, seja para
parar Madrid, seja derrubar reis.
Avise aos jovens que as músicas,
filmes e saberes são proprietários e que só alguns podem ter acesso. Virarão as
costas como se estivessem diante homens de terno e gravata.
A crise que Europa enfrenta é a
mesma que inventa o cinema que temos hoje como um projeto político. Crise do governo
central, do cultura proprietária, dos grandes orçamentos elitizados, da financeirização
da vida, da elitização do saber, da separação entre produtores e consumidores,
de restrição ao acesso.
Como adaptar o mundo a essa nova
cultura? Pergunta errada! Quando na Inglaterra os manifestantes fazem download
material é porque a mudança já aconteceu, não há adaptação possível. A
imaterialidade da produção contemporânea, sua desmesura, ecoa na materialidade,
na carne e no sangue das vidas.
Avise aos jovens que a internet será
controlado e que a banda larga será restrita. Esse é o momento em que o Brasil
parece estar. Momento de escolher entre a democracia, o descontrole das vidas
produtivas, a invenção que pode se desdobrar em riqueza, ou Belo Monte, eliminação
da diferença, homogeneização, aburguesamento revoltado e policial, banda larga
para poucos.
Estamos diante de novos sujeitos políticos e não
apenas de novos consumidores, no mundo e no Brasil. Aqui, quando os pobres consomem são rapidamente chamados
de classe C. Ou seja, são enquadrados em uma partilha da sociedade que lhes
antecede, como se não trouxessem nada de novo.
Se a digressão é excessiva é porque
o cinema hoje tem essa responsabilidade com o país e com o mundo. Ele é
inseparável da invenção que se faz hoje. Essa responsabilidade não é temática
ou discursiva, ela é apenas democrática. Que o cinema seja em si uma forma de
vida dissensual, distante das forças que insistem em organizar o mundo de cima
para baixo e que a eliminam na hora de escolher quem estará na sala – de estar
ou de cinema.
Não colegas, não precisamos do MinC
para levar cultura para ninguém, mas é com o governo Dilma, também, que podemos
antecipar a democracia que a Europa se esforça em negar – as consequências são
evidentes, nossa democracia pode ser outra.
Um comentário:
Parabens Cézar! Muito bom!!
Postar um comentário