A proibição das máscaras nas manifestações aprovada pela Câmara
do Rio e assinada pelo governador essa semana me parece mais um capítulo de uma
truculência que atravessa várias instâncias de poder.
Nesse caso, a truculência é do poder legislativo e
executivo. A truculência da polícia tem sido uma constante. A truculência legal
aparece no caso das recentes prisões e da aluna da UFF que teve seu computador
apreendido e agora retarda sua volta ao Brasil com medo de ser presa. A truculência
da mídia se explicita a cada vez que manifestantes são organizados na chave do
vandalismo. E assim seguimos com excessos de força em múltiplas formas dos
poderes atuarem.
A força é uma das formas do poder se exercer, certamente não
é a mais eficaz.
Quando o poder está internalizado e os sujeitos e
comunidades corroboram os poderes nos pequenos atos do cotidiano, ele e muito
mais sólido. Se no dia-a-dia os modos de vida corroboram as disciplinas, as
constantes demandas por novos produtos, as formas de organização da cidade e as
pautas da grande mídia, enquanto esperam as próximas eleições, então não há
nada errado.
Se entre os processos subjetivos e a naturalização dos
lugares de poder há uma comunhão, basta a esses poderes funcionarem através de
micro adaptações aos movimentos da comunidade.
Entretanto, quando essas formas de vida, seus desejos e
perspectivas de futuro, entram em desacordo com o que parecia natural, o consenso
se desfaz.
Como escreveu o Guattari, não há revolução social sem
revolução do desejo”
Quando
o consenso desmorona, quando o papel que faz o congresso, a mídia, o espetáculo
urbano, o governador e as demandas cotidianas do capital não fazem mais tanto
sentido, o poder deixou de operar na modulação dos modos de vida e precisa
refazer a unidade em torno de si.
Para
garantir a sua centralidade e o consenso, a truculência desses poderes é a arma
indesejável, mas disponível.
Quando
há consenso em torno dos modos da comunidade se organizar e seus
atravessamentos com as múltiplas práticas dos poderes, existem os excluídos dos
dividendos dessa organização, mas quando o consenso se rompe, mesmo os
incluídos se chocam com a cena que esses poderes tentam restabelecer à força.
Nas
escadarias da câmara do Rio de Janeiro encontramos essa disputa por outra cena,
uma disputa que não é apenas por esse ou aquele projeto, por essa ou aquela
injustiça, mas uma expressão que se faz contra os lugares de fala instituídos,
uma manifestação que no mínimo tem duas pautas centrais:
O
que o poder faz e o próprio poder.
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