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O Alex Patez, trabalha na Ancine e é professor de Economia do Audiovisual da UFF.
Abaixo eu copio um relato que ele preparou para o corpo docente da UFF sobre a fala do Padilha no RioContentMarket. Depois do relato o Alex faz algumas considerações.
Agradeço a ele a possibilidade de compartilhar a reflexão e o relato.
Relato resumido da palestra de José Padilha no RioContentMarket, com algumas considerações. Por Alex Patez.
- Segundo Padilha, nos EUA são as grandes empresas distribuidoras quem financiam a atividade de produção - mesmo dos produtores 'independentes'. Ao assumir os riscos econômicos as distribuidoras retêm para si os lucros dos filmes.
- Já no Brasil, segundo o Padilha quem financia o longa é a empresa produtora que, portanto, é quem corre todos os riscos. Vale uma consideração aqui: é muito provável que Padilha, ao omitir a centralidade dos recursos públicos no financiamento da realização de longas e omitir também o fato de que há, de modo geral, pouco dinheiro privado na realização de filmes no Brasil, estava querendo acertadamente enfatizar que, no Brasil, é a empresa produtora quem corre atrás dos recursos para o financiamento dos filmes. É o contrário dos EUA, onde quem faz isso, (muitas vezes, mas nem sempre), é a empresa distribuidora, mesmo no caso dos filmes ditos 'independentes'. Vale observar ainda que no Brasil, ainda que a empresa produtora corra atrás dos recursos, parte considerável dos mesmos não precisem ser devolvidos (implicando risco quase zero para a empresa produtora), como é o caso da utilização de recursos incentivados na produção.
- De acordo com Padilha, o produtor brasileiro tem de assinar um contrato leonino com a distribuidora, de forma mais draconiana do que ocorre nos EUA.
- No modelo vigente a maior parte do lucro ficaria com a distribuidora, frequentemente uma major. Padilha não disse, mas muito desse modelo deve-se à existência do mecanismo do art. 3º da Lei do Audiovisual, que confere às majors (e a algumas distribuidoras de capital nacional) recursos públicos que podem ser alocadas por essas empresas na co-produção de filmes nacionais†.
- No Brasil, a empresa distribuidora faria, de acordo com Padilha, muito pouco: terceiriza todas as atividades, da cópia e logística ao marketing.
- Sendo assim, o produtor poderia, em tese, abrir mão da distribuidora e fazer a mesma coisa, contratando no mercado vários serviços que estão disponíveis às distribuidoras.
- Porém, haveria uma diferença de escala: uma distribuidora major controla, segundo Padilha, um fluxo de filmes americanos lucrativos e com isso detém um poder assimétrico na relação com a empresa exibidora, o que garantiria às grandes distribuidoras o poder de vetar o produto das produtoras independentes; (Padilha mencionou que isso ocorreu de fato com os filmes dele).
- Para o exibidor, só faria sentido exibir um filme independente se este tivesse perspectiva de grandes bilheterias (como Tropa2), e isso, além de possibilitar o cumprimento da Cota de Tela das salas, compensaria uma eventual ‘represália’ das majors.
- Assim, a saída seria uma união das empresas produtoras brasileiras para, aproveitando a exigência da Cota de Tela, manter um fluxo contínuo de filmes brasileiros de qualidade; ele propôs que produtoras brasileiras constituíssem uma distribuidora.
- Sobre a nova distribuidora, Padilha revelou que está negociando com outras produtoras e que a nova empresa faria apenas a prestação do serviço de distribuição, recebendo, para isso, apenas a comissão correspondente; esta distribuidora focaria seu papel de intermediário na atividade, mas a empresa exibidora repassaria diretamente para a produtora toda a parte da bilheteria que caberia à distribuidora/produtora e esta última, por sua vez, repassaria a parte da comissão para a distribuidora (normalmente é a distribuidora quem recebe do exibidor e repassa para o produtora).
- Padilha disse que o modelo por ele proposto não é absolutamente novo, ainda que não seja preponderante em nenhum lugar do mundo; ocorreria nos EUA com a Lions Gate, por exemplo, que topa apenas ‘prestar o serviço de distribuição’, especificamente nos casos em que o produtor consegue alavancar todos os recursos do filme.
- Com a nova distribuidora, Padilha acredita que as receitas das empresas produtoras, que hoje ficam na casa de 5% a 10% da bilheteria, cresceriam 5 vezes (a afirmação é baseada na experiência de Tropa 2).
- Para que um novo modelo prospere, o Estado deveria, segundo Padilha, destinar recursos (do Fundo Setorial do Audiovisual - FSA) prioritariamente para a distribuição, de forma que o produtor pudesse abrir mão de trabalhar a distribuição com uma major, e pudesse, assim, remunerar-se na bilheteria e gradualmente deixar de depender do fomento à produção.
- Padilha não fez distinção entre distribuidoras brasileiras (de capital nacional) e majors que, segundo ele, ‘explorariam’ igualmente as empresas produtoras.
- Padilha criticou o modelo de incentivos fiscais dizendo que comprovadamente não deu certo, e propôs que todo o dinheiro do FSA fosse para o P&A dos filmes que fossem distribuídos por empresas que fizessem apenas o serviço de distribuição nos moldes proposto por ele.
- O novo modelo daria margem, segundo Padilha, para a revisão do modelo atual – fortemente centrado em recursos de renúncia fiscal – e propôs que as leis de incentivo fossem progressivamente extintas.
- A análise de Padilha, corajosa por revelar a dinâmica de relações e poderes entre os três agentes econômicos do segmento de exibição e importante por propor uma nova dinâmica mais propícia à rentabilidade do produtor, tem algumas fragilidades (o que absolutamente não desmerece sua análise):
- (i) omite a centralidade dos recursos públicos no financiamento da atividade e no comportamento das empresas produtoras quando financiam os seus filmes; no Brasil, o risco para a atividade de produção é certamente muito menor do que nos demais países (é só olhar para o lado, para a Argentina, e ver como funciona o financiamento dos filmes por lá), pelo fato de que grande parte dos recursos alocados na produção serem a fundo perdido (indiscriminadamente, sejam para filmes ‘pequenos’ ou ‘grandes’, e indistintamente, sejam para produtoras ‘pequenas’ ou ‘grandes’);
- (ii) foca a possibilidade de sustentabilidade dos filmes brasileiros nas bilheterias das salas de exibição, algo que não ocorrem em nenhum país com uma indústria cinematográfica importante. Nesses países a televisão (aberta e por assinatura), tal como ocorre no Brasil, tem receitas de uma a duas dezenas superiores às salas de exibição. Não é possível uma atividade cinematográfica sustentável sem o envolvimento dos canais de televisão (pagos ou abertos) no financiamento prévio dos filmes (através de pré-licenciamentos) e/ou na rentabilidade dos mesmos (por meio da competição para sua veiculação, o que eleva o valor de licenciamento dos filmes para serem exibidos nas TVs).
- (iii) ignora que o FSA pode cumprir, dentro os instrumentos de política pública voltados ao fomento, funções maiores do que apenas financiar P&A dos filmes de longa-metragem; há que se considerar a estruturação, por exemplo, de toda a produção independente de televisão (incipiente no país) e mesmo o papel FSA na equação de financiamento da realização de filmes de longa-metragem (ainda tão dependente dos recursos de renúncia fiscal).
Um comentário:
Penso que é central para a sustentabilidade do cinema, a expansão do mercado interno. Se as cidades com 100 mil e 50 mil habitantes passassem a exibir filmes, ampliaríamos consideravelmente o público e o volume de recursos em circulação. Consequentemente, ou simultaneamente, a dependencia da cadeia produtiva americana se fragiliza. Pois, e no tamanho do seu mercado que eles tem forca para oferecer um catalogo tao grande e barato.
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