Depois de acompanhar de longe a greve da UFF que já dura dois meses, ontem fui à assembleia que deliberou pela continuação da greve.
A assembleia acontece na semana em que o governo federal amplia em mais de 5 bilhões as verbas para o FIES. O FIES é, segundo o Ministério da Educação, “um programa destinado a financiar a graduação na educação superior de estudantes matriculados em instituições não gratuitas”.
Não gratuitas é um eufemismo para falar dos grandes grupos privados que lucram com educação.
Esta foi a terceira vez no ano que, por meio de medida provisório, o governo ampliou as verbas do FIES.
Alguns grandes grupos privados, como Estácio, Anima e Kroton tiveram, segunda matéria do Estado de São Paulo, aumento de receita em mais de 200% de 2010 até hoje, sendo o FIES grande responsável pela saúde financeira desses grupos.
O grupo Kroton – Pitágoras, Anhanguera, etc – tem quase 60% de seus alunos presenciais matriculados pelo FIES. O detalhe mais triste dessa conta é que, no mesmo período, os gastos desses grupos com professores caíram em 10% da renda líquida. Se em 2010 45% dos gastos eram com professores, hoje esse gasto está em 35%.
A assembleia que manteve a greve acontece ainda em meio à paralisação de universidades que não estão em greve. A escassez de recursos é tanta que parece ser consenso que o governo está interessado em que as universidades fiquem um bom tempo paradas para economizar com custos básicos – eletricidade, água, viagens, reformas, etc.
Diante desse quadro em que a educação pública perde verbas e as “não gratuitas” ganham, não há outra alternativa. É preciso estar em greve certo? Errado.
Na assembleia de ontem se reafirmava uma relação de causa e efeito que me parece perniciosa à luta de todos aqueles que tem interesse na educação pública.
A greve é uma forma de luta e pressão, absolutamente legítima. Entretanto, a precariedade da educação, os baixos salários, o privilégio aos grupos privados não justificam em si a greve. A greve só é justificável quando ela se apresenta como a melhor forma de luta. Nesse sentido, minha impressão é que a assembleia de ontem apenas reafirma que a paralisação das universidades hoje não é a melhor forma.
1 - Fazemos o jogo do pagador desinteressado na educação. O mesmo governo que faz gigantescos repasses para os grupos privados quer as universidades fechadas para não ter gastos por uns meses. O que fazem os professores? Fecham as universidades.
2 - A greve é tímida. Uma professora dizia: precisamos botar a boca no trombone. Sinto muito cara colega, não há trombone, nem bocas. Dos mais de 3000 professores da UFF quantos estão mobilizados? Diante da penúria, a greve colocou os campi vazios e as ações de greve em nada ameaçam a estabilidade do ministério ou as práticas do governo, como prova a nova medida provisória.
Essa é uma greve de pessoas comportadas demais para a situação, nós e os estudantes.
3 -Depois de 2 meses de greve a assembleia não fez uma reflexão crítica sobre suas estratégias; como se falar dos absurdos desse governo bastasse. Se a falta de democracia na educação fosse suficiente para a greve, passaríamos os próximos muitos anos em greve.
A dureza de uma assembleia como a de ontem é sair com a sensação de que a crise é também de criatividade e capacidade de luta para enfrentar uma situação que atinge o país e a democracia como um todo.
Para colocar a boca no trombone é preciso inventar motivos para as bocas aparecerem, é preciso inventar o trombone e tocar fora do tom.
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