28 de jun. de 2008

Um dia no Brasil

Essa foi uma semana de pesquisas.
Ideb, que indica a evolução da educação básica.
Pesquisa sobre desigualdade do Ipea.
Índices sobre desemprego.

Nesta mesma semana, com a morte da D. Ruth Cardoso houve o momento do abraço emocionado entre Fernando Henrique Cardoso e Lula.

No ano passado acompanhei as eleições francesas mais de perto pois estava passando um ano em Paris. A cada debate entre os candidatos, me lembrava da situação brasileira.
Sarkozy é triste para qualquer país, claro. Mas não era apenas ele que trazia um tom de tristeza para quem se interessa em política, para quem gosta daquele país. Ségolène Royal, do Partido Socialista, com quem Sarkozy disputou o segundo turno, também era parte da derrota da política.

As pessoas brilhantes estavam fora da política.

O abraço de Lula e Fernando Henrique me remeteu a esse momento francês em que uma eleição presidencial era decidida por pessoas sem nenhum marco simbólico em suas vidas que desse peso àquele lugar que ocupavam ali.

Goste ou não de Lula ou Fernando Henrique, estamos falando de homens decisivos para o país mesmo antes de terem sido presidentes.

Tenho tido muito orgulho do país. Por uma lado por conta desses resultados expressos nessas pesquisas que citei acima, por outro por conta da experiência que tenho tido como secretário adjunto de Cultura em Nova Iguaçu.


Tenho tido o privilégio de estar cotidianamente em contato com pessoas de um enorme engajamento com a questão pública. De estagiários a diretoras de escolas, de burocratas ao primeiro escalão do governo.

Desse pessoal que está lá não se criará um novo partido, como Lula e os companheiros da época fizeram em 80. Dificilmente sairá um novo Fernando Henrique, os tempos são outros. Mas, certamente, a política não está derrotada como no exemplo francês.

O abraço dos dois ex-presidentes marca um momento histórico e um momento de passagem na nossa história. Lula é real demais para a elite e irreal demais para um país. Estamos agora construindo um pós Lula, como pessoas normais, engajadas, com trabalho sendo feito em de maneira pulverizada em tantos lugares.

Na pesquisa do Ideb, por exemplo, das 30 escolas com Horário integral de Nova Iguaçu em 2007, 22 ultrapassaram a meta colocada pelo Mec. 6 apenas alcançaram a meta apenas 2 não chegaram. Esse sucesso é por conta de pessoas que ganham uma grana muito apertada para o mês, estudam e trabalham muitas horas por dia.

Em uma das primeiras escolas que visitei quando assumi o funcionamento das Oficinas Culturais da cidade, uma coordenadora do Horário Integral (hoje 42 escolas de Nova Iguaçu tem horário Integral para a educação primária) me disse meio en passant, que pegava picolé consignado na venda para vender na escola para poder ter dinheiro para tirar xerox para passar os trabalhos para as crianças.
Contei essa história para uma amigo que reagiu impressionado com a "história de superação".
É verdade, uma bela história de superação. Mas o que me impressionava era o desastre.
Como pode essa pedagoga ter que vender picolé consignado para tirar xerox?
Só eu buscava uma interpretação para aquela história; desastre ou superação.
Para a professora era apenas uma meia hora semanal que resolvia o problema dela com o xerox da mesma semana.

Ontem, durante a Conferência de Cultura da Cidade, tive a honra de poder falar sobre o papel do artista no governo.

Fiz uma fala demasiadamente teórica para um público ávido de respostas e idéias sobre o problema da arte e da cultura no Município. Era como se eu tivesse dando mais atenção ao picolé que à fotocópia. Sai em dúvida sobre a minha abordagem conceitual sobre o "devir artista" do governo, mas feliz com o engajamento e com a possibilidade de poder dizer para o pessoal de fora de Nova Iguaçu o que estamos fazendo por lá, os resultados etc.

Depois da conferência peguei um trem cheio. Na sexta a noite o trem que sai da Baixada para a Central é muito diferente dos outros dias da semana. Pessoas muito pobres, cheias de crianças, travestis e prostitutas. Vim em pé e tentei dormir encostando a cabeça no braço com que me segurava.

Um comentário:

Vinícius Reis disse...

Rapaz, belo texto!
Pensei uma coisa diante da imagem daquele abraço no velório de Dona Ruth: uma das questões entre esses dois grandes brasileiros é o segundo escalão que cada um deles formou pra governar. Nesse quesito tão importante, FHC nunca teve a mesma sorte que Lula.
Abraços,
Vinícius.