Realmente, a matéria do CQC em Barueri é espetacular.
Como sabemos, espetacular não quer dizer que ela é boa, mas que nos mobiliza em sua dimesão excesiva.
É difícil não tirar grande prazer em ver corruptos e autoridades concentradas em suas auto-promoções sendo expostos ao ridículo.
Mas, se o programa nos dá toda essa satisfação é bom desconfiar.
Primeiramente, a TV assume um papel que faz com que o entretenimento ande junto do papel de polícia. Tal prática é corriqueira em programas populares que não só fazem as vezes da polícia mas também do juiz e do carrasco.
Investigar, julgar e penalizar são ações contíguas a uma mesma emissão, tudo isso com o ritmo do espetáculo, com a música bem escolhida, com a ironia e a precisão do humor dos rapazes do CQC.
Pois, o primeiro estranhamento diz respeito então a esse papel da TV.
É essa a televisão que queremos e que nos mobiliza? Policial e vingativa, fazendo justiça com as própria mãos. Note que este questionamento deve ser feito antes de a TV ter escolhido a causa - a corrupção, um assassino, um artista excentrico, não interessa.
Unir essa lógica da política com a do sistema de julgamento e punição é que me parece especialmente grave, não apenas por que entregamos para uma emissora privada o direito de escolher que investigação fazer e como julgar, mas, também, porque deixamos que a lógica do espetáculo tenha primazia sobre a lógica da justiça.
Podemos perceber bem no caso do CQC em Barueri o funcionamento que subsume o justo ao espetacular.
Antes de tudo, para o CQC, a corrupção é desejada.
Tudo começa com uma televisão de plasma de 32 polegadas. Há um abuso de poder econômico ai. Nas escolas públicas não há espaço simbólico para essa televisão. O que é o sonho de consumo privado o CQC leva para o espaço público, para escolas que lidam com outras carências, outros "sonhos".
O CQC, antes de documentar a corrupção é o corruptor. Claro que nada justifica o roubo que a funcionária da prefeitura faz, mas ao doar uma TV desse tipo para uma escola, o programa da Bandeirantes e seus anunciantes tratam o estado como o inimigo que deve ser humilhado em sua pobreza e fragilidade.
O CQC escolhe ainda um período sem aulas para a doação.
Por todos os lados o CQC vai se garantindo, feliz por garantir o espetáculo, com a certeza de estar do lado certo, contente por corrigir a sociedade.
Um comentário:
Há que desconfiar sempre, mesmo! Se o caso em questão não fosse algo engendrado pelo programa ainda vá lá, mas dar a corda para nego se enforcar já é exagero, parece até pegadinha. Por traz da "boa ação", há uma sede de "ver sangue", mas o sangue do Estado??? A troco de quê? Chutar cachorro morto não vale. Isso só enfraquece a crença nas instituições, que já está em crise há muito tempo, o que me parece bastante perigoso numa democracia.
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