20 de nov. de 2014

Escola inventa e Dorival Caymmi


       Em uma antiga entrevista com a artista inglesa Bridget Riley, ela narra sua formação no Royal College of Art em que, segundo ela, a pedagogia era: “o mundo lá fora vai ser muito difícil, então é melhor começar com as dificuldades aqui”. A ideia de que o a escola precisa antecipar o mundo que nos desagrada não é exclusividade do Royal College que Riley conheceu, mas presente em uma enorme parte da educação.
      Essa antecipação possui pelo menos dois aspectos determinantes para o que será a escola.
      O primeiro é que o mundo está pronto e a escola é um modelador; na mais tradicional técnica disciplinar. A escola precisa treinar e adaptar os jovens para “o que está ai”; a competição, o individualismo, a ideia da superação, a atenção constante, a maximização do tempo de trabalho, a resistência física e intelectual aos desafios do trabalho “que irão te exigir no limite”. Assim então deve ser a escola, um espelho do que virá. A ironia maior é que conseguimos isso. A escola do pobre é pobre, a do rico é rica. Adaptar para o mundo que está ai pode ainda ter desdobramentos mais trágicos para jovens que vivem em bairros violentos com altos índices de criminalidade. Ter a escola como microcosmos de mundos possíveis parece ser um mínimo a se exigir da educação.
      O segundo, de ordem mais estritamente temporal, retira o presente da escola como um problema ético, estético e pedagógico para colocar no futuro as justificativas para aquilo que a escola é hoje. Ou seja, se a relação entre alunos, professores e funcionários não é boa, se a escola não possui artes ou música, se os jovens estão exaustos e estressados, se a participação dos pais é clientelista, tudo isso não é visto como um problema pedagógico, mas como algo a ser administrado para que a escola possa ter bons resultados.
       Como sabemos, qualquer reunião de pais de alunos de segundo grau acaba girando em torno do Enem. E, um pai de uma criança de 8 anos que pergunta em uma reunião sobre o resultado da escola no Enem não é uma aberração. Em outras palavras, o que a escola faz hoje só interessa na medida dos resultados que terá lá na frente.
      Tal problema temporal reverte a função da avaliação, tanto da escola quanto do aluno. No lugar de avaliar, a avaliação modula. No lugar de mapear sucessos e problemas, a avaliação impõe modelos. Nesse sentido, defendo que o Enem deveria ser completamente diferente a cada ano. Um ano o texto exigido deveria ser uma poesia, no outro uma carta para o Dorival Caymmi, no terceiro um diálogo entre amantes. Talvez isso ajudasse a trazer a educação para o presente dela. E quando alguém perguntar o que vai cair na prova, poderíamos responder: a vida inteira.

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Dorival Caymmi é cantor e compositor baiano, nasceu em 14 e morreu em 2008.
Bridget Riley é artista inglesa, nascida em 31 e conhecida por seus trabalhos de arte ótica.

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