“Não consigo ler um livro, não consigo ver um filme até o final e não tenho concentração para nada.”
É assim que com frequência temos vivido a possibilidade de tempo livre para ler um livro, ver um filme e se concentrar.
É assim que com frequência temos vivido a possibilidade de tempo livre para ler um livro, ver um filme e se concentrar.
Talvez a ansiedade que impossibilita a concentração esteja diretamente ligada à incerteza e à velocidade.
Vivemos esse estranho paradoxo entre estarmos parados e tudo estar muito muito rápido – as mortes, o contágio, a instabilidade política. Temos a impressão – e a vivência - de que a cada momento algo novo pode acontecer e que o vírus pode chegar muito perto.
A dificuldade em desviar, imaginar, se entregar a uma ficção quando a realidade parece nos afetar com intensidade e velocidades que não dominamos, é enorme.
Como não estar aqui, como entregar o corpo a outra experiência quando tudo parece incerto e ameaçador?
Como não estar aqui, como entregar o corpo a outra experiência quando tudo parece incerto e ameaçador?
Vivemos esse encontro entre o tipo de mídia que usamos hoje, com a velocidade do vírus e seus efeitos. Grudamos nos celulares, notícias, tabelas de casos pelo mundo, artigos, reflexões, etc. A cada segundo são muitas abas tentando dar conta das múltiplas variáveis que o momento traz.
Somos, mais do que nunca, exigidos como editores de uma enxurrada. Se esquivar do vírus e nos tornarmos editores de tudo que nos chega, não é uma tarefa que se faz com a tranquilidade exigida por um romance que descreve o bordado da gravata do protagonista.
À essa união entre incerteza e velocidade se junta a insegurança do que está por vir.
Lidar com a ansiedade de quem espera a hora de tudo voltar ao normal já é algo bastante grande. Entretanto há algo ainda mais dispersivo: talvez o “normal” tenha se dissolvido. Talvez aquela vida que se interrompeu tenha se tornado obsoleta e indesejável. Se assim é, só há uma solução: precisaremos imaginar, ficcionalizar, inventar. Que voltem os livros, a poesia, os filmes. É com eles que desenhamos um mundo.
Enquanto ainda não inventamos um corpo para a urgência da imaginação que a concentração em livros e filmes permite, vamos dormir todas noites e nosso inconsciente vai se ocupando um pouco disso.
Felizmente os sonhos sabem lidar com incertezas e velocidades alucinadas.
-- Diário do entre-mundos 13 --
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