Essa semana uma querida amiga na França me escreve contando que a mãe passou três semanas hospitalizada com Covid 19. Momentos duríssimos. “Pela primeira vez fui atravessada pela possibilidade de meus pais morrerem”. Recebo essa mensagem no dia em que havia decidido que deveria escrever sobre saudades na quarentena. Creio que esse momento produz um estranho esgarçamento do tempo. A incerteza do futuro, a angústia dessa incerteza, encontra reverberações em passados mais distantes, em futuros que ainda não tínhamos imaginado. Assim, nas últimas semanas lembro de momentos de meu pai, morto há mais de duas décadas, como raramente faço. Como se essas ondas para o passado trouxessem essas memórias, as saudades. Momentos de instabilidade subjetiva parecem produzir essas buscas por linhas organizadoras, por afetos significantes e intensos, por vezes envoltos em nuvens de esquecimento e distância. Talvez estejamos também experimentando o que é ser idoso, estar em casa e ter nas memórias todo um campo de exploração. “Na idade em que estou não é hora de começar nada muito novo”. Essa dura formulação joga a vida para o vivido.
Esses fragmentos, não sei se são sobre saudade, mas sobre novas linhas estendidas no tempo que esse momento entre-mundos nos força, ou convida, a criar. Talvez seja com elas as possibilidades de um futuro.
Esses fragmentos, não sei se são sobre saudade, mas sobre novas linhas estendidas no tempo que esse momento entre-mundos nos força, ou convida, a criar. Talvez seja com elas as possibilidades de um futuro.
-- Diário do entre-mundos 27 –
Ps. A mãe da minha amiga se recupera em casa.
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