E daí? Pergunta Bolsonalro quando questionado sobre as quase 500 mortes de ontem.
Dai que para entender do que estamos falando você teria que ter duas sensibilidades.
Dai que para entender do que estamos falando você teria que ter duas sensibilidades.
A primeira de que a vida importa. Mas já sabemos há muitos anos que o que importa é o gozo com a morte.
A segunda é mais complexa. Bolsonaro é um negacionista. Transforma a história em um problema de opinião. Tudo pode ser relativizado, tudo depende de um ponto de vista.
Em 2020, o negacionista olha para a ditadura e se autoriza a dizer e a criar o que quiser. Para que isso seja possível, para que o cinismo se efetive, é preciso olhar a ditadura como um bloco total sem vidas.
Quando nos aproximamos do que se passava com cada família que perdia parentes, como cada pessoa que tinha que deixar o país, com cada perseguição, com cada sessão de cinema proibida, com o medo cotidiano e com cada torturado, não há história que possa se livrar das pessoas. Não há história que se torne apenas um nome a ser defendido em um carro de som em Brasília.
Quando nos aproximamos do que se passava com cada família que perdia parentes, como cada pessoa que tinha que deixar o país, com cada perseguição, com cada sessão de cinema proibida, com o medo cotidiano e com cada torturado, não há história que possa se livrar das pessoas. Não há história que se torne apenas um nome a ser defendido em um carro de som em Brasília.
O negacionista só pode existir se nega que o grande evento, o grande marco histórico, é formado por uma infinidade de vidas que não estão nos holofotes.
Ao perguntar "E daí?" Bolsonaro mata uma segunda vez os que sofrem. Depois de mortos pelo Covid e pela incompetência fascista desse governo, são mortos porque devem ser eliminados da história. As formas de vida, de moradia, de saúde, as desigualdades, as formas de trabalho e alimentação, o transporte, tudo isso eliminado para que se possa retirar da história tudo que constitui cada uma das vidas perdidas.
A segunda sensibilidade é simples na verdade. As pessoas existem.
Um mundo sem vida e sem pessoas, e daí?
Um mundo sem vida e sem pessoas, e daí?
-- Diário do entre-mundos 33 --
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